Muito se fala que o adolescente é “aborrecente”, pois se aborrece com facilidade, é irritadiço,
demonstra inconformidade com as leis estabelecidas dentro e fora de casa, não
tem muito interesse em estudar, passa horas dormindo, troca o dia pela noite,
não fica muito tempo em família... Mas é importante percebemos que a linha que
separa a normalidade da patologia é muito tênue, ou seja, estes mesmo sintomas
citados acima podem fazer referência a um quadro de depressão na adolescência. Por
isso, o que você interpreta como ‘firula’ pode estar falando de um sofrimento
significativo.
Na década de 70 nem se cogitava o fato de crianças e adolescentes poderem
apresentar sintomas que levassem ao diagnóstico de depressão. Foi só a partir de
1975 (digo, recentemente) que a existência da depressão nessa faixa etária foi
reconhecida, abrindo as portas para pesquisas e estudos nessa área. A principio, os critérios diagnósticos para
depressão nas três faixas etárias eram os mesmo, mas estudos mais profundos e
específicos mostraram que há alguns sintomas típicos a cada fase , pois eles
variam com a idade e sua fases de desenvolvimento e maturação. A titulo de
curiosidade, apresento os sintomas da depressão segundo o Manual Diagnóstico e
estatístico de transtornos mentais (DSM-IV) comparados com sintomas
diferenciais da depressão na adolescência citados em artigos científicos sobre
o tema:
SINTOMAS DE
DEPRESSÃO SEGUNDO DSM IV
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SINTOMAS
TÍPICOS DE DEPRESSÃO NA ADOLECENCIA
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Humor depressivo ou irritável
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Irritabilidade e instabilidade
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Humor deprimido
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Fadiga ou perda da energia
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Perda de energia
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Interesse ou prazer acentuadamente diminuído
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Desmotivação e desinteresse importante
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Agitação ou retardo psicomotor
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Retardo psicomotor
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Sentimento de inutilidade ou culpa excessiva ou
inadequada
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Sentimentos de desesperança e/ou culpa
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Insônia ou hipersonia
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Alterações do sono
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Isolamento
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Capacidade diminuída de pensar ou se concentrar ou
indecisão
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Dificuldades de concentração
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Prejuízo
no desempenho escolar
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Baixa
autoestima
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Pensamentos de morte recorrentes, ideação suicida,
tentativa ou plano suicida.
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Ideias e tentativas de suicídio
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Problemas
graves de comportamento
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Diminuição ou aumento do apetite e também do peso
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A irritação (explosões de raiva), o humor instável, apatia, hipersonia,
isolamento, aparecem como sintomas
típicos da depressão na adolescência ,
sendo que o baixo desempenho escolar pode ser um marcador importante. Alguns sintomas também se diferenciam com relação
ao gênero. A baixa autoestima
relacionada a aparência e a popularidade é mais evidente nas meninas,
assim como sintomas subjetivos como melancolia, vazio, tristeza e raiva. A problematização
da autoestima pode levar as meninas desenvolverem transtornos alimentares como bulimia, anorexia e obesidade. Já meninos apresentam seus sintomas no “acting
out” (passagem ao ato), ou seja, ficam evidentes nas ações impulsivas e
inconsequentes, os famosos ditos ‘problemas de conduta’, sendo que o abuso de
álcool na adolescência é um indicador de depressão na adolescência. Importante
salientar que ‘sair pra balada’ muitas vezes é interpretado pelos pais como se
o filho estivesse bem (está até saindo), mas a festa em alguns casos é a
válvula de escape e o álcool algo que amenize a dor ou que faça esquecê-la. A automutilação
também é um sintoma que se faz presente na depressão nesta faixa etária. Se machucar, se cortar pode ter uma característica
de autopunição e de comportamento de risco que pode culminar em tentativas de
suicídio.
Por se tratar de uma fase de transição entre a infância e a vida adulta ,
é na adolescência que definimos questões importantes de nossa vida e
personalidade. É uma fase de descobertas, repleta de ‘primeiras vezes’, o
desconhecido assusta e a insegurança vem. Fase dos amores platônicos, das
descobertas sexuais, dos vestibulares, das escolhas diferentes das dos pais,
das mudanças no corpo e de escolher “quem eu vou ser na vida” sempre muito
pressionado pelo social. Dentro deste cenário, a causa da depressão nesta fase
de vida não é clara e acredito que nem possa ser, pois cada ser humano é UM,
UNO! Mas existem evidencias científicas que comprovam o peso da hereditariedade,
ou seja, a presença de depressão em um
dos pais aumenta três vezes o risco do adolescente também ter a doença. Eventos estressores (perdas, abusos, traumas)
e ambiente familiar também são elencados como fatores de risco para a depressão
nessa faixa etária. Família não perceptiva, apoiadora e compreensiva está
diretamente relacionada com sintomas depressivos nos adolescentes.
O que torna o diagnostico de depressão na adolescência mais concreto é a
perseverança dos sintomas, ou seja, períodos prolongados e duradouros de
irritabilidade, isolamento, baixa repentina do rendimento escolar. Os amigos
próximos são os que percebem melhor as mudanças de comportamento, inclusive,
melhor que os pais. Em minha visão clinica, acredito que se o adolescente apresenta estes
sintomas por três meses ou mais já é hora de criar uma estratégia de
tratamento. O tratamento se baseia em psicoterapia e, dependendo do grau, se
necessita a atuação do psiquiatra. O adolescente necessita muito de um espaço
de fala, pois esta é a fase onde as questões emocionais em ebulição estão
melhor identificadas através do subjetivo. Por isso, este é um alerta aos pais que podem minimizar os
sintomas apresentados por seus filhos colocando um rótulo de ABORRECENTE.
Esteja atento a ele, converse, esclareça, questione, ouça e compreenda.
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